Tema 2: A Igreja, Povo de Deus, Corpo de Cristo e Templo do Espírito
Dom Henrique Soares da Costa, Bispo de Palmares (PE).
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a) A Igreja enraizada no      Deus uno e trino 
                
 Já vimos que a      Igreja sempre esteve no plano de Deus; vimos também
 que ela começou a      existir na Páscoa do Senhor Jesus: ela vive do 
Espírito Santo que o Cristo,      enviado do Pai derramou sobre ela. A 
Igreja vive, portanto, na Trindade      Santa. Ela não é uma simples 
reunião nascida da vontade humana nem da boa      vontade de seus 
membros: a Santa Trindade é a vida da Igreja: 
     
Há diversidade de dons mas      um mesmo é o Espírito. Há diversidade de ministérios mas um mesmo é o     Senhor. Há diferentes atividades mas um mesmo é Deus que      realiza todas as coisas em todos (1Cor 12,4ss).
     
     Há um só Corpo e um só      Espírito, assim como fostes chamados por vossa vocação para uma só      esperança. Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo. Há um só      Deus e Pai de todos, que está acima de todos, por todos e em todos (Ef      4,4ss). 
     
Cada
      divina Pessoa da Santa Trindade tem uma relação própria com a 
Igreja,      dando-lhe a mesma vida divina que salva de um modo peculiar
 a cada Pessoa da      Trindade: o Pai (um só Deus) é a fonte de toda a 
Vida; o Filho (um só      Senhor) é o mediador desta Vida; o Espírito é a
 própria Vida! Esta realidade      impressionante aparece de modo muito 
claro e profundo na idéia da Igreja      como Povo de Deus Pai, Corpo de
 Cristo e Templo do Espírito Santo. 
     
b) A Igreja, Povo de      Deus Pai 
                 Já vimos que no      Antigo Testamento Israel é o povo de Deus, o povo eleito, consagrado e      escolhido:
     
     Agora,
 se realmente ouvirdes      minha voz e guardardes a minha aliança, 
sereis minha propriedade exclusiva      dentre todos os povos. De fato é
 minha toda a terra, mas vós sereis para mim      um reino de sacerdotes
 e uma nação santa. São estas as palavras que deverás      dizer aos 
israelitas” (Dt 19,5s). 
     
Este povo era a qahal IHWH      (= assembléia do Senhor Deus), a santa assembléia do Deus de Israel. Daí      veio o nome ekklesía (=
 Igreja). Pois bem, a Igreja é o povo de Deus      da nova aliança, é o 
novo povo de Deus, reunido pela palavra do Pai, dita em      Jesus 
Cristo: 
     
     Cumpriu-se o tempo e o Reino      de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho (Mc 1,15). 
     
O
      próprio Jesus tinha isso em mente quando escolheu Doze para 
segui-lo: eles      são os alicerces do novo povo, como os doze filhos 
de Jacó (= Israel) foram      os alicerces do antigo povo: 
     
     Depois
 subiu ao monte e chamou      os que ele quis. E foram ter com ele. E 
constitui Doze para ficarem em sua      companhia e para enviá-los a 
pregar, com o poder de expulsar os demônios (Mc      3,13ss). 
     
A
      Igreja é, portanto, o novo povo que Cristo veio reunir para Deus, 
seu Pai. É      interessante como a Igreja assume essa identidade de 
Israel da nova aliança: 
     
     A todos os que pautam sua      conduta por esta norma, paz e misericórdia sobre eles e sobre o Israel de      Deus (Gl 6,16). 
     
     Mas
 vós sois uma raça      eleita,um sacerdócio régio,uma nação santa, o 
povo de sua particular      propriedade, para apregoar os grandes feitos
 daquele que vos chamou das      trevas para a sua luz admirável. Vós, 
que outrora não éreis povo, agora sois      o povo de Deus; vós, que não
 havíeis alcançado misericórdia, mas agora      conseguistes 
misericórdia (1Pd 2,9s). 
     
Assim,
      a Igreja, novo Israel, é povo de Deus Pai, o povo definitivo, da 
nova      aliança, reunido em nome de Jesus Cristo. Este povo não é mais
 ligado pelos      vínculos de sangue, mas pela fé em Jesus Cristo, que 
conduz ao batismo e à      eucaristia: 
     
     Todos
 vós, pois, sois filhos      de Deus pela fé em Cristo Jesus. Pois todos
 vós, que fostes batizados em      Cristo, vos revestistes de Cristo. Já
 não há judeu nem grego, nem escravo      nem livre, nem homem nem 
mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus.      Ora, se sois de 
Cristo, então sois verdadeiramente a descendência de Abraão,      
herdeiros segundo a promessa (Gl 3,26ss). 
     
                 Ora, afirmar que a Igreja é povo de Deus tem algumas      conseqüências importantes: 
     
(i) Deus só tem um povo, uma      Igreja, que é sinal da unidade de toda a humanidade em Cristo (cf. Jo      11,51s): 
     
     (Cristo) nos lavou de nosso      pecados com seu sangue, e fez de nós um Reino e sacerdotes para Deus seu Pai      (Ap 1,5s). 
     
(ii)
      Neste povo entramos pelo batismo, sacramento da fé em Jesus. 
Assim, nos      tornamos membros do povo da aliança; povo de irmãos, 
povo de iguais na      dignidade de filhos de Deus: 
     
     Vós,
 não vos deixeis chamar de      mestre, porque um só é vosso mestre, e 
todos vós sois irmãos. A ninguém      chameis de pai na terra, porque um
 só é vosso Pai, aquele que está nos céus.      Nem vos façais chamar 
doutores, porque um só é vosso doutor, o Cristo. O      maior entre vós 
seja vosso servo. Aquele que se exaltar será humilhado e      quem se 
humilhar será exaltado (Mt 23,8ss). 
     
(iii)
      Como o povo de Israel, somos um povo escolhido em Jesus: povo de 
sacerdotes,      de profetas e de reis (= servidores): 
     
     Mas
 vós sois uma raça      eleita,um sacerdócio régio, uma nação santa, o 
povo de sua particular      propriedade, para apregoar os grandes feitos
 daquele que vos chamou das      trevas para a sua luz admirável (1Pd 
2,9). 
     
     Eu
 vos exorto, pois, irmãos,      pela misericórdia de Deus, que vos 
ofereçais em vossos corpos, como hóstia      viva, santa, agradável a 
Deus. Este é o vosso culto espiritual (Rm 12,1). 
     
(iv)
      Este povo, como o Israel do Antigo Testamento, é um povo a 
caminho, um povo      de peregrinos rumo à Pátria do céu. Sendo assim, a
 Igreja não será nunca      plena neste mundo: somente na glória ela 
chegará a ser plenamente aquilo que      deve ser. Até lá, ela precisará
 sempre de conversão, de renovação e de      reforma: 
     
     Portai-vos com temor durante o      tempo do vosso exílio (1Pd 1,17; cf. 1,1). 
     
     Eu
 vos exorto, pois, irmãos,      pela misericórdia de Deus, que vos 
ofereçais em vossos corpos, como hóstia      viva, santa, agradável a 
Deus. Este é o vosso culto espiritual (Ap 21,1; cf.      2 – 3). 
     
(v)
      Como povo de Deus, a Igreja deverá sempre viver no mundo, 
empenhada na      transformação do mundo e, ao mesmo tempo, manter viva a
 consciência de não      ser do mundo: 
     
     Caríssimos,
 peço-vos que, como      forasteiros e peregrinos, vos abstenhais dos 
desejos da carne que combatem      contra a alma. Observai entre os 
pagãos uma conduta exemplar. Assim, naquilo      mesmo em que vos 
caluniam como malfeitores, considerando vossas boas obras,      
glorifiquem a Deus no dia da Visitação.
     
     Por
 amor do Senhor      submetei-vos a toda autoridade humana, quer ao 
imperador, como soberano,      quer aos governadores, como delegados, 
para castigo dos malfeitores e elogio      dos bons. Tal é a vontade de 
Deus que pela prática do bem façais emudecer a      ignorância dos 
insensatos. Como homens livres e não à maneira dos que tomam      a 
liberdade como véu para cobrir a malícia, mas vivendo como escravos de  
    Deus.  Honrai a todos, amai os irmãos, temei a Deus, respeitai o 
imperador.
     
     Manifestou-se
 com efeito a      graça de Deus, fonte de salvação para todos os 
homens. Veio para nos ensinar      a renúncia à impiedade e aos desejos 
mundanos, para vivermos sóbria, justa e      piedosamente neste século, 
aguardando nossa esperança feliz e a vinda      gloriosa do grande Deus e
 do Salvador nosso, Jesus Cristo. Ele, que se      entregou por nós a 
fim de nos resgatar de toda iniqüidade e adquirir para si      um povo 
exclusivamente seu e zeloso na prática do bem. 15 Assim é que deves     
 falar e exortar e repreender com toda a autoridade. E ninguém te 
despreze!
     
     Admoesta
 a todos que vivam      submissos aos príncipes e às autoridades, que 
lhes obedeçam e estejam      prontos para qualquer boa obra. Não 
injuriem a ninguém, sejam pacíficos,      afáveis e dêem provas de 
mansidão para com todos os homens.
     
     Porque
 também nós outrora      éramos insensatos, rebeldes, extraviados, 
escravos de toda sorte de paixões      e prazeres, vivendo na maldade e 
na inveja, dignos de ódio e odiando uns aos      outros. Mas um dia 
apareceu a bondade de Deus, nosso Salvador, e seu amor      para com os 
homens. E não por causa das obras de justiça que tivéssemos      
praticado, mas unicamente em virtude de sua misericórdia, ele nos salvou
      mediante o batismo de regeneração e renovação do Espírito Santo, 
que      abundantemente derramou sobre nós por Jesus Cristo, nosso 
Salvador, a fim de      que a justificação de sua graça nos torne, 
segundo a esperança, herdeiros da      vida eterna (Tt 2,11 – 3,7). 
     
     Porque,
 ainda que alguns sejam      chamados deuses, quer no céu, quer na 
terra, de maneira que haja muitos      deuses e muitos senhores, para 
nós não há mais do que um só Deus Pai, de      quem tudo procede e para 
quem nós existimos; e um só Senhor, Jesus Cristo,      por quem existem 
todas as coisas e nós também (1Cor 8,5s). 
     
(vi)
      Povo de Deus peregrino, como o Israel do deserto, só que agora 
guiado pelo      Espírito, a Igreja deve viver em contínua tensão 
escatológica – isto é,      consciente que caminha para a Glória e 
desejosa dessa mesma Glória; por isso      mesmo, envolvendo-se com tudo
 quanto no mundo é justo e bom, ela, no      entanto, não se encanta com
 nada nem absolutiza realidade alguma deste mundo      nem ideologia 
nenhuma: 
     
     Quando orardes, dizei: “Pai,      santificado seja o teu Nome; venha o teu Reino!” (Lc 11,2) 
     
     O
 Espírito e a Esposa dizem:      “Vem!” Aquele que atesta estas coisas 
diz: ”Sim, venho muito em breve!”      Amém! Vem, Senhor Jesus!” (Ap 
22,17.20) 
     
     Procedei
 com sabedoria no      trato com os de fora, sabei aproveitar o tempo 
presente. A vossa palavra      seja sempre agradável, temperada de sal, 
para saberdes como convém responder      a cada um (Cl 4,5s). 
     
                 Concluindo, é importantíssimo que tenhamos a 
consciência que      somos um povo nascido da aliança que Deus selou com
 a humanidade em Jesus      Cristo. Não somos povo segundo a raça, a 
cultura, a classe social, a opção      política ou a situação econômica:
 somos o povo que Deus reuniu em Cristo na      unidade do Espírito, 
conforme a promessa a Abraão, nosso pai! Vinda do Pai,      é para o Pai
 que a Igreja caminha e somente nele encontrará repouso: 
     
     Ele
 nos predestinou para      sermos seus filhos adotivos por meio de Jesus
 Cristo, conforme o beneplácito      de sua vontade, para o louvor e 
glória de sua graça! (Ef 1,5s) 
     
c) A Igreja, corpo de      Cristo 
                
 Vimos que a Igreja      é povo de Deus: povo de Deus da nova aliança. 
Mas, como podemos ser povo de      Deus, se não somos descendência de 
Abraão? A promessa fora feita a Abraão e      a seus descendentes. É 
aqui que adquire toda sua importância e sentido a      imagem do corpo 
de Cristo: a Igreja á povo de Deus precisamente porque é      corpo de 
Cristo. Vejamos: 
     
     Ora,
 as promessas foram feitas      a Abraão e à sua descendência. Não diz: 
“e a seus descendentes”, como se      fossem muitos, mas fala de um só: e
 a teu descendente que é Cristo (Gl      3,16). 
     
São
      Paulo afirma que a descendência de Abraão por excelência é Cristo,
 ele, que      sintetiza e traz em si todo o povo de Israel. Pois bem, 
pelo batismo, tendo      recebido o Espírito do Cristo, nós todos nos 
tornamos membros seus, membros      do seu corpo, que é a Igreja: 
     
     Com
 ele fomos sepultados pelo      batismo na morte para que, assim como 
Cristo ressuscitou dos mortos pela      glória do Pai, assim também nós 
vivamos uma vida nova. Pois, se nos tornamos      uma só coisa com ele 
por sua morte, também seremos uma só coisa com ele por      uma 
ressurreição semelhante à sua (Rm 6,4s). 
     
     Pois
 num só Espírito todos nós      fomos batizados para sermos um só corpo e
 todos, quer judeus, quer gregos,      quer escravos, quer livres, 
bebemos do mesmo Espírito (1Cor 12,13). 
     
Sendo
      uma só coisa com Cristo, membros seus, somos, em Cristo, 
descendência de      Abraão segundo o Espírito de Cristo! Trata-se de 
uma união misteriosa e real      com o Senhor Jesus ressuscitado!
     
A Igreja é, portanto, o corpo      de Cristo e dele recebe vida, harmonia, crescimento e direção: 
     
     (Ele
 é) a Cabeça, pela qual      todo o Corpo, alimentado e coeso pelas 
juntas e ligamentos, realiza o seu      crescimento em Deus (Cl 2,19). 
     
Esta
      idéia é belíssima e profunda: a Igreja está constantemente unida a
 Cristo,      recebe a vida de Cristo, depende de Cristo, é 
continuamente sustentada por      Cristo. Uma idéia similar é encontrada
 nas palavras de Jesus na alegoria da      videira e dos ramos (cf. Jo 
15,1-11). Como os ramos não sobreviveriam sem a      seiva do tronco e a
 ele unidos, assim também a Igreja, não poderia      sobreviver senão 
unida a Cristo e sendo continuamente vivificada pelo seu      Espírito 
Santo: 
     
     Há um só Corpo e um só      Espírito, assim como é uma só a esperança da vocação a que fostes chamados (Ef      4,4). 
     
Esta,
      então, é a grande realidade de nossa união com Cristo: somos seu 
corpo e      membros uns dos outros: todo o Antigo Testamento caminhava 
para este      mistério tão grandioso: 
     
     Portanto,
 ninguém vos julgue      por questões de comida e de bebida, ou a 
respeito de festas anuais ou de lua      nova ou de sábados, que são 
apenas sombra de coisas que haviam de vir, mas a      realidade é o 
corpo de Cristo. Ninguém, com afetada humildade ou com o culto      dos 
anjos, vos prive do prêmio, fazendo alarde do que viu, inchado de um vão
      orgulho por seu pensamento carnal, ignorando a Cabeça, pela qual 
todo o      Corpo, alimentado e coeso pelas juntas e ligamentos, realiza
 seu crescimento      em Deus (Cl 2,16-19). 
     
                 Esta realidade de ser corpo de Cristo chega ao máximo na      eucaristia: 
     
     Quem
 come minha carne e bebe      meu sangue tem a vida eterna e eu o 
ressuscitarei no último dia. Porque      minha carne é verdadeiramente 
comida e meu sangue é verdadeiramente bebida.      Quem come minha carne
 e bebe meu sangue permanece em mim, e eu nele. Assim      como o Pai, 
que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim também quem comer      de
 minha carne viverá por mim (Jo 6,54-57). 
     
     O
 cálice de bênção que      abençoamos não é ele a comunhão com o sangue 
de Cristo? E o pão que partimos      não é ele a comunhão com o corpo de
 Cristo? Já que há um único pão, nós      embora muitos, somos um só 
corpo, pois todos participamos desse único pão      (1Cor 10,16s). 
     
A
 ponto      de São Paulo afirmar que quem come o Corpo de Cristo na 
eucaristia sem      discernir o corpo do Senhor, que é a Igreja, come e 
bebe a própria      condenação: 
     
     Por
 conseguinte, que cada um      se examine a si mesmo antes de comer 
desse pão e bebe desse cálice, pois      aquele que come e bebe sem 
discernir o Corpo, come e bebe a própria      condenação (1Cor 11, 28). 
     
                 Afirmar que a Igreja é corpo de Cristo, leva-nos a algumas      conseqüências muito importantes: 
     
(i)
 A imagem do corpo ressalta      a unidade da Igreja; unidade que é 
fruto da presença do Espírito do      Ressuscitado. Se os membros são 
muitos, no entanto o corpo é um só! Cristo      só tem um corpo, como 
também reuniu um só povo. Este povo, este corpo é a      Igreja! Veremos
 isso de modo mais detalhado quando pensarmos na unidade e      
unicidade da Igreja de Cristo, mais adiante. 
     
     Ele
 é a nossa paz: de ambos os      povos fez um só, tendo derrubado o muro
 de separação... a fim de criar em si      mesmo um só Homem Novo, 
estabelecendo a paz e de reconciliar a ambos com      Deus em um só 
Corpo (Ef 2,14s). 
     
     Fomos todos batizados num só      Espírito para ser um só corpo (1Cor 12,13). 
     
(ii)
 Se      a Igreja é corpo de Cristo, esse corpo é formado por membros 
diversos, com      diversos carismas e ministérios, todos eles 
suscitados pelo Espírito do      Ressuscitado. Na Igreja ninguém é 
expectador, ninguém fica de fora: leigo (laikós)      quer dizer: o que está por dentro (= laós: povo de Deus + ikós:      o que pertence a = leigo: o que pertence ao povo de Deus). 
     
     Há
 diversidade de dons mas um      mesmo é o Espírito. Há diversidade de 
ministérios mas um mesmo é o Senhor.      Há diferentes atividades mas 
um mesmo é Deus que realiza todas as coisas em      todos. A cada um é 
dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum.      Porque, 
assim como o corpo, sendo um só, tem muitos membros e todos os      
membros do corpo, sendo muitos, são um só corpo, assim também é Cristo 
(1Cor      12,4-7.12). 
     
(iii)
 A      imagem do corpo recorda-nos também com clareza que a Igreja 
depende      totalmente do Cristo, e isso de modo constante. É Cristo 
quem vivifica a sua      Igreja e a sustenta, sobretudo pelos 
sacramentos – a idéia da carne de      Cristo que dá vida e da videira e
 dos ramos são ilustração dessa realidade: 
     
     É
 ele que a uns fez apóstolos,      a outros profetas, a estes 
evangelistas, àqueles pastores e doutores, para o      aperfeiçoamento 
dos santos, para a obra do ministério, na edificação do      Corpo de 
Cristo, até que todos nós cheguemos à unidade da fé e do      
conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado de Homem 
Perfeito, a      medida da estatura da plenitude de Cristo. Assim, não 
sejamos mais como      crianças ao sabor das ondas, agitados por 
qualquer sopro de doutrina, ao      capricho da maldade dos homens e de 
seus artifícios enganosos. Mas, vivendo      segundo a verdade e na 
caridade, cresceremos em tudo, achegando-nos àquele      que é nossa 
Cabeça, Cristo. Em virtude de sua vida, o Corpo, todo coordenado      e 
unido por cada vínculo de ministério que corresponde à força própria de 
     cada membro, cresce e se edifica na caridade (Ef 4,11-16). 
     
(iv)
      Ligada à imagem do corpo, há também a idéia da Igreja como esposa,
 amada por      Cristo, única eleita. A idéia de esposa ajuda a corrigir
 a idéia do corpo: 
     
     E
 vós, maridos, amai as vossas      mulheres como Cristo amou a Igreja e 
se entregou por ela, a fim de      purificá-la com o banho da água e 
santificá-la pela Palavra... Quem ama a      sua mulher ama-se a si 
mesmo, pois ninguém jamais quis à sua própria carne,      antes 
alimenta-a e dela cuida, como também faz Cristo com a Igreja (Ef      
5,25s.28b-29). 
     
Se,
 por      um lado, a Igreja é uma só coisa com Cristo, como seu corpo, 
por outro, é      distinta de Cristo, como sua esposa: Cristo é criador;
 a Igreja é criatura.      Entre o Cristo e sua Igreja a distância é 
infinita (por isso São Paulo usa      também as idéias machistas da 
sociedade patriarcal da época para exprimir a      relação entre a 
Igreja-esoposa e o Cristo-esposo). 
     
(v)
 A imagem do corpo,      finalmente, deixa claro que a Igreja é central 
no plano de Deus: ela é o      espaço da nossa salvação; é nela que o 
Espírito do Cristo age, unindo-nos ao      nosso Salvador. É impossível,
 absolutamente, um Cristo sem Igreja. Mais      ainda: a plenitude do 
Cristo, como cabeça do corpo, somente vai acontecer na      plenitude da
 Igreja, no final dos tempos. É um mistério impressionante: a      
plenitude do Filho de Deus feito homem está ligada indissoluvelmente à  
    plenitude do corpo, que é a Igreja: 
     
     Tudo
 ele (o Pai) pôs debaixo      de seus pés, e o pôs acima de tudo, como 
Cabeça da Igreja, que é o seu      Corpo: a plenitude daquele que 
plenifica tudo em tudo (Ef 1,22). 
     
Esta      união íntima e misteriosa é também entre cada membro e todo o corpo, que é a      Igreja: 
     
     Agora
 eu me regozijo nos meus      sofrimentos por vós, e completo na minha 
carne, o que falta das tribulações      do Cristo pelo seu Corpo, que é a
 Igreja (Cl 1,24). 
c)A Igreja, templo do      Espírito 
                
 Demos, agora, mais      um passo: precisamente porque a Igreja é corpo 
de Cristo, ela é também      templo do Espírito: 
     
     Estava
 próxima a Páscoa dos      judeus. Jesus subiu a Jerusalém e encontrou 
no Templo vendedores de bois, de      ovelhas e pombas e os cambistas 
sentados. Fez um chicote de cordas e      expulsou todos do Templo, com 
as ovelhas e os bois; esparramou no chão o      dinheiro dos cambistas e
 derrubou as mesas. Aos que vendiam as pombas,      disse: “Tirai daqui 
tudo isso e não façais da casa de meu Pai uma casa de      comércio”. 
Lembraram-se os discípulos de que está escrito: O zelo de tua      casa 
me consome.
     
     Os judeus tomaram a palavra e      lhe perguntaram: “Que sinal nos dás para fazeres isto?”
     
     Jesus
 respondeu: “Destruí este      Templo e em três dias eu o levantarei”. 
Então os judeus disseram: “Quarenta      e seis anos levou a construção 
deste Templo e tu vais levantá-lo em três      dias?” Mas ele falava do 
Templo de seu corpo. Quando ressuscitou dos mortos,      os discípulos 
se lembraram do que ele havia dito e creram na Escritura e na      
palavra de Jesus (Jo 2,13-22). 
     
Com
 a sua páscoa, Jesus pleno      do Espírito Santo, foi totalmente 
transfigurado no seu corpo, que agora,      ressuscitado, é templo do 
Espírito, é o novo lugar de encontro entre Deus e      a humanidade. O 
Templo dos judeus, portanto, era somente imagem e      prefiguração do 
corpo do Ressuscitado, verdadeiro templo de Deus: 
     
     Ora,
 quando os sacerdotes      saíram do lugar santo, a Nuvem encheu o 
templo do Senhor, modo que os      sacerdotes não puderam continuar as 
funções por causa da Nuvem; é que a      glória do Senhor tinha enchido o
 templo do Senhor.
     
     Salomão
 disse: “O Senhor quis      morar na Nuvem escura. Eu construí para ti 
uma morada, uma mansão para tua      perpétua habitação” (1Rs 8,10-13). 
     
Na Escritura, a Nuvem, a      Glória, a Shekinah,
 são símbolos do Espírito Santo! Portanto, o      templo tomado pela 
Nuvem é profecia do corpo de Cristo, plenificado e      habitado pelo 
Espírito! Ora, este templo de Deus, corpo de Cristo, pleno do      
Espírito Santo, é a Igreja: 
     
     Assim
 já não sois estrangeiros      e hóspedes mas concidadãos dos santos e 
membros da família de Deus,      edificados sobre o fundamento dos 
apóstolos e profetas, tendo por pedra      principal o próprio Cristo 
Jesus. É nele que todo edifício, harmonicamente      disposto, se une e 
cresce até formar um templo santo no Senhor; nele vós      também sois 
integrados na construção para vos tornardes morada de Deus no      
Espírito (Ef 2,19-22).
     
     Vós
 sois o edifício de Deus.      Não sabeis que sois um templo de Deus e 
que o Espírito de Deus habita em      vós? O templo de Deus é santo e 
esse templo sois vós (1Cor 3,9.16s).
     
     Em
 Cristo, bem articulado,      todo o edifício se ergue em santuário 
sagrado, no Senhor, e vós, também,      nele sois co-edificados para 
serdes uma habitação de Deus, no Espírito (Ef      2,21s).
     
     Também
 vós, como pedras vivas,      constituí-vos em um edifício espiritual (=
 no Espírito), dedicai-vos a um      sacerdócio santo, a fim de 
oferecerdes sacrifícios espirituais (= no      Espírito) aceitáveis a 
Deus por Jesus Cristo (1Pd 2,5). 
     
Santo Agostinho compreendeu      bem o significado desses textos bíblicos: 
     
     Aquilo
 que o nosso espírito,      ou seja, a nossa alma, é para os nossos 
membros, o mesmo é o Espírito Santo      para os membros de Cristo, para
 o corpo de Cristo, que é a Igreja. 
     
Dizer que a Igreja é templo do      Espírito, significa: 
     
(i)
 que a Igreja é      permanentemente habitada e possuída pelo Santo 
Espírito; que a edifica      continuamente, fazendo-nos pedras vivas; 
     
(ii)
 que a Igreja é santa,      porque totalmente habitada pelo Espírito de 
Santidade, de modo a ser coluna      e fundamento da verdade (cf. 1Tm 
3,15). 
     
(iii) que o Espírito a edifica      como templo que é ao mesmo tempo corpo de Cristo para a glória do Pai! 
d) Conclusão 
                
 A Igreja, então, é      realmente povo de Deus, pois foi tornada corpo 
de Cristo pelo Espírito Santo      recebido no batismo. Este mesmo 
Espírito é o que glorificou o corpo de Jesus      ressuscitado, 
tornando-o seu templo santo. Assim, porque corpo de Cristo, a      
comunidade eclesial é realmente templo do Santo Espírito, é comunhão do 
     Espírito Santo e no Espírito Santo!
 
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